É senso comum a associação do trabalho de policiais militares ao perigo e risco contínuo de morte violenta no exercício diário de suas atividades. Aumenta essa percepção da população sobre o trabalho desses profissionais da segurança pública as várias notícias publicadas pelos jornais e os vários programas televisivos que apresentam, diariamente, as ações e situações de confrontos em que eles estão envolvidos.
Está, então, no senso comum que a maior causa de mortes de policiais militares é por confrontos em serviço; ou seja, mortes em decorrência de troca de tiros ou de outras situações de enfrentamento tático.
Porém, como nos mostra o Anuário Brasileiro de Segurança Públicas de 2024, no ano de 2023 o país registrou queda de 18,1% na taxa de policiais civis e militares vítimas de Crimes Violentos Letais e Intencionais, enquanto a taxa de suicídios de policiais civis e militares da ativa cresceu 26,2%. Isso, comparado com os registros do ano de 2022.
Somente em relação a policiais militares, o total nacional de suicídios nas corporações superou, em 2023, a soma dos registros de mortos em confronto em serviço e fora de serviço. Foram 110 registros de suicídios de policiais militares, ante 107 casos de mortos em confronto em serviço e fora de serviço.
No estado de São Paulo, considerando os suicídios de policiais militares, houve aumento de 63% dos casos entre 2022 e 2023.
São Paulo registrou 31 ocorrências de suicídio de policiais miliares da ativa em 2023. Em 2022 foram registradas 19 ocorrências. O Estado não forneceu registros de suicídio de policiais civis para 2023.
São Paulo registrou alta no número de policiais militares mortos em confronto em serviço entre 2022 e 2023: de 6 para 9 registros, respectivamente. Dentre policiais civis, foram 3 casos, contra 1 em 2022.
Como pode ser constatado, o número de suicídios de policiais militares foi, em 2023, 245% maior que os decorrentes de confronto em serviço.
Como apontado por José Ferdinando Ramos Ferreira, pesquisador do Observatório de Segurança Pública da Universidade de Campinas – Unicamp, “outro ponto importante é a taxa de suicídio na população brasileira, que é de 0,07% por 100 mil habitantes, enquanto entre os policiais essa taxa é de 0,3% por 100 mil. Isso significa que, proporcionalmente, os suicídios entre policiais são quatro vezes mais frequentes do que no restante da sociedade”.
De acordo com Meire Cristina de Souza, do Instituto de Pesquisa, Prevenção e Estudos em Suicídio (Ippes), “o contato constante com situações de conflito e a pressão em atividade de risco aumentam a probabilidade de desenvolver transtornos mentais, como o transtorno de estresse pós-traumático. Entre 2015 e 2022, 12.584, entre policiais civis e militares no Brasil, foram acometidos com uma patologia da saúde mental: ansiedade 5.289, depressão 4.735 e síndrome do pânico 3.576”.
Essas avaliações desses especialistas em segurança pública foram apresentadas durante o I Seminário Nacional de Prevenção ao Suicídio e Trabalho, promovido pelo Programa de Pesquisa-intervenção “Saúde Mental e Trabalho” da Diretoria de Pesquisa Aplicada da Fundacentro, coordenado pelo médico psiquiatra e professor universitário Marcelo Kimati, que ocorreu em setembro de 2024.
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