sábado, 25/10/2025
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Crítica: a superficialidade de Apocalipse nos trópicos e a inflação artificial de Silas Malafaia

Filme "Apocalipse nos Trópicos" ignora a complexidade do movimento evangélico e foca no pastor, diz análise.
Cena de "Apocalipse nos Trópicos" com o presidente Lula - Foto: Netflix / Divulgação
Cena de “Apocalipse nos Trópicos” com o presidente Lula – Foto: Netflix / Divulgação

Por Sergio Ribeiro

O documentário Apocalipse nos Trópicos dirigido por Petra Costa, promete desvendar a relação entre movimento evangélico e política no Brasil, mas acaba reduzindo um fenômeno complexo a uma narrativa maniqueísta centrada na figura do pastor Silas Malafaia. Apesar da relevância do tema e do acesso privilegiado a bastidores do bolsonarismo, o filme comete um erro estratégico: transformar Malafaia no arquiteto único da aliança evangélica com a extrema direita, ignorando a pluralidade e as dinâmicas estruturais que de fato moldam esse cenário. Vamos aos fatos:

1. A superestimação de Malafaia como “cérebro” do poder. evangélico

O documentário dedica a Malafaia um protagonismo desproporcional, retratando-o como o puppet master, ou seja, um manipulador por trás de Jair Bolsonaro. Cenas em seu jatinho (“Favor de Deus”), sua BMW blindada ou sua mansão no Rio reforçam a imagem de um líder onipotente. No entanto, essa abordagem ignora dados concretos, como segue:

A igreja de Malafaia (Assembleia Vitória em Cristo) é um ramo minoritário das Assembleias de Deus, que somam 12,3 milhões de fiéis. Os grupos com maior influência política são Madureira (liderada pelo bispo Manoel Ferreira) e a Igreja Universal do Reino de Deus, ambas praticamente ausentes do filme. Denominações como batistas, presbiterianos e luteranas têm projetos políticos autônomos e são apagadas na narrativa.

Malafaia é, de fato, midiático e barulhento, mas sua representatividade é limitada. Ao elevá-lo à “voz dos evangélicos”, o documentário reproduz sua própria estratégia de autopromoção e não a realidade sociorreligiosa brasileira.

2. A negligência da diversidade evangélica e o reforço de estereótipos

Ao focar exclusivamente em Malafaia, Petra Costa:

  • Invisibiliza as correntes progressistas. Não há espaço para vozes como o Fórum Evangélico Nacional que articulam resistência ao avanço da extrema direita.
  • Simplifica o apoio a Bolsonaro. O documentário ignora que muitos católicos participaram dos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023, além de desconsiderar motivações locais (redes de solidariedade, políticas comunitárias) que atraíram fiéis ao bolsonarismo.
  • Reduz o evangelicalismo a um projeto de poder: a tese da Teologia do Domínio”(que defere o controle cristão sobre o Estado) é apresentada como eixo unificador, embora seja marginal entre pastores e fiéis. Para muitos, o engajamento político é uma resposta a ameaças concretas (como pautas de gênero) e não um plano teocrático.

3. O oportunismo de Malafaia e a cumplicidade não intencional do filme

Malafaia não é vítima da narrativa de Costa: é seu cúmplice estratégico, como analisa o antropólogo Juliano Spyer – o pastor usou o documentário como cavalo de troia. Para não evangélicos, apresentou-se como o estereótipo do líder intolerante, confirmando preconceitos da esquerda secular. Para seu rebanho, posou como mártir perseguido consolidando sua imagem de “guerreiro da fé”.

A cena em que ameaça um motoqueiro no trânsito, por exemplo, foi incluída como prova de seu autoritarismo, mas serve a seu marketing de “homem sem papas na língua”.

O apagamento do contexto histórico e sociológico

O filme falha ao não explorar:

  • O declínio católico: como a crise institucional da Igreja Católica (fechamento de paróquias, rigidez burocrática) abriu espaço para igrejas evangélicas que oferecem respostas ágeis a problemas urbanos.
  • Raízes internacionais: A menção à influência dos EUA (via Billy Graham e Henry Kissinger) é superficial. Não detalha como a CIA financiou o movimento evangélico durante a Guerra Fria para combater a Teologia da Libertação.
  • Falhas da esquerda: Lula é retratado como defensor da laicidade, mas sua tentativa de dialogar com evangélicos via figuras com pouca representatividade não se mostrou eficaz.

Enfim, o documentário “Apocalipse nos Trópicos” dirigido por Petra Costa, Silas Malafaia emerge como o único construtor da aliança evangélica com a extrema direita em detrimento à relação entre movimento evangélico e política no Brasil que intenciona mostrar.

Sergio Ribeiro – Foto: Facebook

Sergio Ribeiro é bacharel e mestre em Ciências Sociais pela PUC-SP. Foi duas vezes prefeito de Carapicuíba e vice-presidente estadual do PT-SP. Sua dissertação de mestrado foi publicada pela Editora Pluralidades, em 2025, com o título “Assembleia de Deus: o segredo do Negócio. Ministério de Madureira Campo de Carapicuíba/SP”.

1 COMENTÁRIO

  1. Na minha opinião o que está acontecendo é que não mudou nada em relação a conhecimento e cultura. O povo sempre foi liderado e agora misturando a religião a política juntou a fome com a vontade de comer para os políticos . O povo parece não perceber o que o Bolsonaro e seus filhos estão fazendo. Meu Deus acordei essas pessoas elas não vêem que estão querendo colocar cabresto no povo e o povo está se deixando levar nos dias de hoje . A DITADURA SE FOSSE BOA TERIA PERMANECIDO. A mídia poderia colaborar um pouco mais esclarecendo ao povo com palavras mais simples o que está acontecendo. E previnir para ano que vem que é ano de eleição. Não podemos deixar eles acabarem com o Brasil . Tivemos 4 anos de Bolsonarismo que vai deixar rastro no mundo por muito anos . Período do Bolsonaro chama -se PERIODO DA DESTRUIÇÃO DO MUNDO. E ELE COM SUA CORJA FALA PRO POVO QUE ELE AGE DENTRO DAS QUATRO LINHAS E QUE ELE É ” DEUS , PATRIA E FAMILIA . IMAGINEM SE ELE NAO FOSSE . ……,…….,……….

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