domingo, 8/06/2025
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Truculência

Sem ordem judicial, mas com bombas: PM reprime MST em usina responsável por mortandade de peixes

Polícia reprime movimento com truculência; MST ocupou usina como parte do Abril Vermelho: “Ocupar para o Brasil alimentar”

Por Gabriela Moncau, do Brasil de Fato

MST ocupou Usina denunciada por mortandade de peixes - Foto: Gabriela Moncau/Brasil de Fato
MST ocupou Usina denunciada por mortandade de peixes – Foto: Gabriela Moncau/Brasil de Fato

Cerca de 400 famílias do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) foram expulsas com violência, na manhã desta segunda-feira (7), de uma área da Usina São José S/A Álcool e Açúcar em Rio das Pedras (SP), onde buscavam fixar acampamento. Pertencente ao Grupo Farias, a empresa foi multada em R$ 18 milhões pela Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb), por provocar a morte, em julho de 2024, de cerca de 235 mil peixes no rio Piracicaba.

Ao menos quinze viaturas da Polícia Militar (PM) e duas da Guarda Civil Municipal estavam na área, sobre a qual voava um helicóptero da PM. Segurando escopetas calibre .12, policiais pediram que os sem-terra liberassem uma via – que já estava liberada – para a passagem de caminhões. Depois, deram cinco minutos para que o acampamento fosse desfeito. Antes que os militantes pudessem desmontar as estruturas no local, os agentes armados começaram a repressão com bombas e sem apresentação de ordem judicial.

Uma mulher muito próxima do estouro de uma das bombas inalou a fumaça, passou mal e precisou ser carregada para dentro do ônibus do grupo sem-terra. Ainda não há informações sobre o estado de saúde da militante.

A ocupação, iniciada ao raiar do dia desta segunda, faz parte da Jornada Nacional de Lutas em Defesa da Reforma Agrária. Mais conhecida como Abril Vermelho, a principal mobilização anual do MST tem em 2025 o lema “Ocupar para o Brasil alimentar”. Embaixo da placa da entrada da usina, os sem-terra estenderam três faixas, entre as quais “Cadê o peixe do rio? A Usina São José destruiu”. No terreno, as famílias do MST encontraram grande quantidade de inseticidas e agrotóxicos. Entre eles, Engeo Pleno: produto fabricado pela Syngenta e pela Bayer, proibido na Europa e associado à morte de abelhas.

“Está na Constituição a destinação de áreas de crimes ambientais para a realização da reforma agrária”, ressalta nota da direção estadual do MST, ao explicar a escolha da área ocupada. Além da denúncia pública do impacto causado pelo modelo de produção da Usina, a ocupação teve o objetivo, de “exigir que as terras do Grupo Farias sejam destinadas para assentar famílias. Além do crime ambiental, a empresa possui dívidas, o que demonstra a insustentabilidade do agronegócio”, diz a nota.

Policiais destroem estruturas de acampamento – Gabriela Moncau/Brasil de Fato

Ao Brasil de Fato, Marcio Santos, da direção nacional do MST em São Paulo, reforçou que o movimento observa a ação da Polícia Militar como “extremamente ilegal”. “Não tinha reintegração de posse, não tinha ação judicial. Eles chegaram simplesmente com uma determinação política, com a orientação de não tolerar uma ocupação legítima naquele local”, disse.

Policiais militares desmontam barracas do MST - Foto: Gabriela Moncau/Brasil de Fato
Policiais militares desmontam barracas do MST – Foto: Gabriela Moncau/Brasil de Fato

“Hoje foi mais um episódio vergonhoso da polícia do Tarcísio [de Freitas, governador de São Paulo] que usa todo aparato repressivo para reprimir trabalhadores que fazem manifestação justa em defesa da reforma agrária e contra os crimes ambientais”, acrescentou o dirigente, destacando ainda que usina ocupada “deve milhões para o governo”.

Ao lado da guarita da Usina São José, o MST abriu a faixa com o lema da jornada de lutas de abril de 2025 – Gabriela Moncau / Brasil de Fato

Contaminação sem precedentes

O derramamento de melaço de cana-de-açúcar atribuído pela Cetesb à Usina São José matou cerca de 50 toneladas de peixes. De acordo com a investigação da agência ambiental, a contaminação começou no ribeirão Tijuco Preto, afluente do rio Piracicaba e percorreu cerca de 70 quilômetros até chegar na Área de Proteção Ambiental Tanquã, região apelidada de “mini Pantanal paulista”. O episódio foi considerado o maior desastre ambiental já registrado no rio Piracicaba. Segundo a Cetesb, a fiscalização feita em 2024 na usina encontrou uma situação de “descontrole” no escoamento de líquidos e vazamentos nos tanques de armazenamentos.

Integrantes do MST junto à guarita de entrada da usina São José - Foto: Gabriela Moncau/Brasil de Fato
Integrantes do MST junto à guarita de entrada da usina São José – Foto: Gabriela Moncau/Brasil de Fato

O Brasil de Fato entrou em contato com a Usina São José e não teve retorno até o fechamento da matéria. Caso haja retorno, o texto será atualizado.

O caso de derramamento de rejeitos mostra, na avaliação de Jelson*, também coordenador do acampamento, “como o agronegócio, não só canavieiro, mas das suas várias ramificações, é altamente tóxico e destrutivo”.

“Essa área não cumpre a sua função social”, salienta o sem-terra. “Por isso que a gente fez essa denúncia e cobrou que seja atendida a nossa pauta de arrecadação e desapropriação dessa área, sem indenização por conta do crime ambiental”, defende. Após o despejo, os sem-terra fizeram uma manifestação na praça central da cidade de Piracicaba (SP).

*Nomes foram trocados para proteger a identidade dos entrevistados.

Nota da bancada do PT

A bancada da federação PT/PCdoB/PV na Assembleia Legislativa emitiu uma nota de solidariedade ao MST e criticando a ação da PM:

A Bancada das deputadas e deputados estaduais da Federação PT/PCdoB/PV manifesta apoio e solidariedade às famílias dos integrantes dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST, que nas primeiras horas da manhã de 07/04, foram violentamente reprimidas e expulsas da manifestação pacífica de protesto e denúncia que realizavam na fazenda Usina São José e Açúcar, situada no município de Rio das Pedras responsável por crime ambiental que provocou a mortandade de milhares de peixes do Rio Piracicaba, em julho de 2024.

A ação do MST integrada por cerca de 400 famílias faz parte da tradicional Jornada do Abril Vermelho que ao chegarem à fazenda foram cercadas por quinze viaturas da polícia militar, com homens ostentando armamento pesado reprimiram os trabalhadores com bombas de efeito moral, sem nenhum diálogo numa operação violenta e ilegal, uma vez que não disponham de qualquer decisão judicial de reintegração de posse, numa flagrante ação política autoritária e de opressão ao Movimento dos Trabalhadores Sem Terra.

São Paulo tem uma dívida histórica com os trabalhadores rurais, acentuada pelo governo Tarcísio que logo no início de sua gestão agraciou grileiros com desconto de 90%, para legalizar a tomada de terras públicas.

Há muito tempo a oposição tem apontado a necessidade de políticas públicas de apoio e investimentos para os trabalhadores rurais e pequenos produtores, destinação de terras públicas para reforma agrária, além de dispor mais recursos para órgãos de controle ambiental.

Nós, deputadas e deputados estaduais cobraremos das autoridades os embasamentos legais da ação policial e exigimos que o governo Tarcísio tenha como base os princípios democráticos que pressupõe respeito aos movimentos sociais, diálogo e tratamento digno a todos os cidadãos, inclusive aos resolvam protestar.

Deputado Donato Líder da Federação PT/PCdoB e PV

Fonte:
Brasil de Fato
https://www.brasildefato.com.br/2025/04/07/com-bombas-e-15-viaturas-pm-de-sp-reprime-ocupacao-do-mst-em-usina-responsavel-por-morte-de-235-mil-peixes/
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