quarta-feira, 24/12/2025
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Governo de SP propõe mudança profunda na progressão de professores e reacende embate na ALESP

Projeto de lei altera critérios de carreira, avaliação e remoção e é criticado por ampliar poder discricionário da gestão sobre a vida funcional dos docentes.

Por Radar Democrático

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O projeto de lei encaminhado pelo Governo de São Paulo à Assembleia Legislativa (ALESP) para alterar as regras de progressão da carreira dos professores da rede estadual abriu uma nova frente de tensão entre o Executivo e a comunidade educacional. Apresentada sob o argumento de modernizar a gestão de pessoas e valorizar o mérito, a proposta tem sido interpretada por parlamentares críticos ao governo como um movimento de endurecimento das regras de progressão, fragilização de direitos e ampliação do controle administrativo sobre a carreira docente.

O texto, que tramita em regime de urgência, modifica dispositivos centrais do atual plano de carreira, afetando professores, coordenadores pedagógicos e diretores de escola. Entre os pontos mais sensíveis estão a vinculação direta da progressão à avaliação anual de desempenho, a possibilidade de remoção por interesse da administração e a transferência de definições centrais para regulamentações posteriores, por meio de decretos e portarias.

O projeto desloca o eixo da carreira de um modelo baseado em tempo de serviço, formação e referências salariais para um modelo fortemente meritocrático, com critérios ainda indefinidos e potencialmente punitivos.

Avaliação como eixo central da progressão

Atualmente, a progressão na carreira docente paulista está estruturada em referências salariais, interstícios e critérios combinados de formação, tempo e desempenho, conforme a legislação vigente após a reforma da carreira implementada nos últimos anos. Embora já existam avaliações, elas integram um conjunto mais amplo de critérios e não operam como um filtro anual obrigatório para evolução funcional.

Com o novo projeto de lei, a avaliação anual de desempenho passa a ser condição central para a progressão, e seus critérios deixam de estar definidos diretamente na lei. O texto prevê que parâmetros, indicadores e procedimentos sejam estabelecidos posteriormente por atos do Executivo, o que, segundo críticos, amplia a insegurança jurídica e abre espaço para subjetividade na aplicação das regras.

Remoção e mobilidade: outro ponto de tensão

Outro aspecto que provoca forte reação é a alteração das regras de remoção. Hoje, a mobilidade do professor ocorre majoritariamente por interesse do servidor, respeitando critérios objetivos e concursos de remoção. A proposta do governo amplia as hipóteses de remoção no interesse da administração, inclusive associadas ao desempenho funcional.

Carlos Giannazi, deputado estadual, alerta que essa mudança pode afetar a estabilidade do professor na unidade escolar, com impactos diretos sobre vínculos pedagógicos, projetos de longo prazo e a própria organização das comunidades escolares, especialmente em regiões mais vulneráveis.

Críticas das entidades e impacto na carreira

Sindicatos e associações do magistério afirmam que o projeto não foi amplamente debatido com a categoria e que representa um novo passo na direção de um modelo de gestão inspirado na lógica empresarial, com metas, rankings e sanções indiretas. Há também preocupação de que faltas, afastamentos e condições de trabalho — muitas vezes precárias — passem a influenciar negativamente a avaliação, dificultando a progressão e ampliando desigualdades dentro da rede.

Para os críticos, o discurso da valorização docente não se sustenta sem investimentos estruturais, melhoria das condições de trabalho e políticas de formação continuada articuladas à carreira.

Quadro comparativo — Progressão de professores em São Paulo

AspectoRegras VigentesProposta do Projeto de Lei
Modelo de carreiraEstruturado em referências salariais, interstícios, formação e critérios combinados de desempenho.Mantém referências, mas subordina a progressão à avaliação anual de desempenho.
Progressão salarialEvolução vinculada a critérios objetivos previstos em lei e regulamentos já existentes.Progressão condicionada à aprovação em avaliação anual, com critérios a serem definidos posteriormente.
Avaliação de desempenhoExiste, mas integrada a outros fatores e não obrigatória anualmente para progressão.Torna-se central e obrigatória para progressão, com parâmetros definidos por decretos/portarias.
Definição dos critériosCritérios previstos em lei e regulamentações já conhecidas pela categoria.Critérios transferidos para regulamentação futura, ampliando discricionariedade do Executivo.
RemoçãoPredominantemente por interesse do servidor, com regras objetivas.Amplia hipóteses de remoção no interesse da administração, inclusive vinculadas ao desempenho.
Recesso e faltasRegras definidas em legislação e normas consolidadas.Recesso e contagem de faltas podem ser redefinidos por ato administrativo.
Segurança jurídicaMaior previsibilidade da evolução funcional.Maior incerteza sobre progressão, avaliação e permanência na unidade escolar.
Visão das entidadesCarreira já enfrenta entraves, mas possui regras conhecidas.Projeto é visto como retirada de direitos e instrumento de controle gerencial.

Com a tramitação acelerada, o projeto tende a mobilizar audiências públicas, atos de professores e pressão sobre os deputados estaduais. Giannazi sinaliza preocupação com a concentração de poder regulatório no Executivo.

O desfecho do debate na ALESP poderá redefinir não apenas as regras de progressão, mas o próprio sentido da carreira docente no estado de São Paulo, com impactos de longo prazo sobre a atratividade da profissão, a permanência de professores na rede e a qualidade da educação pública.

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Rogério Bezerra
Rogério Bezerrahttps://gravatar.com/creatorloudly177c571905
Geógrafo, Mestre, Doutor e Pós-doutor em Política Científica e Tecnológica pela Unicamp. Foi Diretor de Pesquisa Aplicada da Fundacentro. Coordenador do Movimento Pela Ciência e Tecnologia Pública. Atua especialmente em temas relacionados à análise e avaliação de políticas públicas.

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