
A autonomia e independência dos defensores públicos de São Paulo etá ameaçada por um projeto de lei (PLC 20/2025) que está na Assembleia legislativa de São Paulo )Alesp. Segundo deputadas do PSOL e representantes de movimentos sociais, a criação do Grupo de Assessoramento de Demandas Estruturais (Gade) é uma ameaça ao direito à justiça e à defesa das populações mais vulneráveis.
O tema foi debatido nesta terça-feira, 6, em audiência pública organizado pela deputada Paula da Bancada Feminista (PSOL). As falas convergiram para um ponto: o Gade pode limitar a autonomia funcional e institucional dos núcleos especializados da Defensoria, impactando diretamente o atendimento à população.
A criação do Gade e a falta de transparência na construção do projeto foram os alvos principais das críticas. Catherine Fasoranti, representante do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), criticou a falta de consulta à sociedade civil e a concentração de poder na administração superior da Defensoria. “Essa proposta concentra poder muito grande nas mãos da administração superior, enfraquecendo uma das áreas mais essenciais da instituição, a defesa dos direitos coletivos e difusos.”

O projeto de lei trata, principalmente da carreira dos defensores públicos, mas muda também a organização da Defensoria. Yan Bugato Funck, do MTST, questionou a falta de clareza sobre a função do Gade. “O que não é aceitável é esse projeto de lei vir também junto com uma criação de um grupo de assessoramento que mal está explicado ali no projeto de lei o que é esse grupo.”
Maria Cristina Quirino, mãe de vítima da violência em Paraisópolis, criticou a retirada da autonomia dos núcleos. “Como você vai tirar a autonomia de um núcleo que atua para a sociedade? Como você vai fazer uma barbaridade dessa? Porque, para mim, isso é barbaridade.”

A deputada Paula reforçou a importância da Defensoria Pública como resultado da luta social por acesso à justiça para aqueles que não podem pagar um advogado. “Nunca é demais lembrar que a Defensoria Pública existe como resultado de uma luta política e social de movimentos que conquistaram a existência da Defensoria Pública como uma forma de fortalecer o acesso à justiça daqueles e daquelas que não tinham condições de pagar um advogado e, por isso, tinham de forma muito limitada o seu acesso à justiça garantido.”
Amanda Rodrigues, do Instituto Terra, Trabalho e Cidadania, denunciou a falta de diálogo com os movimentos sociais. Segundo ela, a Defensoria afirma que o projeto foi feito em diálogo com a sociedade, mas “isso é uma mentira descarada, porque, se ela tivesse conversado com a gente, tivesse proposto uma audiência, ela saberia que os movimentos sociais apoiam, sim, o fortalecimento de suas carreiras, a expansão da Defensoria”

Roberta, da Conectas Direitos Humanos, criticou a pressa na votação do projeto, que tramita em regime de urgência na Alesp. “Por que a pressa de ser votado? Foi por causa dessa mobilização da sociedade civil que a gente conseguiu que o projeto segurasse até agora, porque, senão, ele teria sido votado em julho e praticamente toda a população, ou boa parte da população, sequer sabia da existência dele.”
A deputada estadual Ediane Maria (PSOL) destacou a representatividade feminina e negra na política e a necessidade de um olhar sensível para as demandas da população, inclusive o acesso à justiça e a garantia do direito de defesa. “Criar quatro filhos sozinha não é fácil, e precisamos muito de um olhar sensível, de um olhar de cuidado, de um olhar que olhe para demandas estruturais que permeia todos nós.”
Diversos participantes relataram suas experiências com a Defensoria Pública, destacando sua importância para a população vulnerável e a necessidade de sua autonomia. A defesa dos direitos das comunidades tradicionais, das periferias, da população LGBTQIA+, dos trabalhadores ambulantes e das pessoas em situação de rua foi uma constante nos discursos.

A deputada Mônica Seixas (PSOL) reforçou a importância da clareza nos textos legais e o papel do Legislativo em aprimorar o projeto. Ela também se colocou à disposição para apresentar emendas e buscar um consenso. “Se não houver resposta da Defensoria, eu acho que não resta ao pessoal a alternativa de lutar pela supressão total do GAD do texto.”
Ao final da audiência, ficou decidido que o conteúdo do debate seria anexado ao processo de votação do PLC. Os movimentos sociais se comprometeram a continuar mobilizados e pressionando os parlamentares para garantir que a reestruturação da Defensoria Pública não represente um retrocesso no acesso à justiça e na defesa dos direitos da população vulnerável.
O projeto de lei está na Comissão de Constituição, Justiça e Redação (CCJR) e já recebeu 16 emendas. Parte delas propõe alterações no Gade, como a atribuição de natureza consultiva em vez de deliberativa; outras, suprimem por completo os dispositivos que tratam da criação do órgão.
A proposição da DPE também inclui aumento do quadro de pessoal (membros e servidores) e reposição salarial de 6%.