
A Comissão Arns divulgou uma nota pública expressando “consternação” diante das mais de cem mortes decorrentes da operação policial nos Complexos do Alemão e da Penha, no Rio de Janeiro. A entidade manifestou solidariedade às famílias das vítimas, incluindo os quatro policiais mortos, e lamentou os traumas sofridos pelos moradores.
A nota é um duro protesto contra o que a Comissão Arns classifica como “sucessão de chacinas” em áreas pobres do Rio, apontando para um “descontrole” que transformou o “inaceitável” em “padrão de conduta do Estado”. A comissão questiona como a sociedade chegou a um ponto em que a força bruta se tornou o único critério e o estado de exceção, a regra.
A Comissão Arns afirma que o Estado, além de não garantir a segurança pública, tornou-se “promotor da insegurança, do desespero e do mais absoluto desconsolo”. A nota critica a falta de “inteligência operacional orientada por senso ético” nas forças públicas, que, segundo a comissão, exacerbam a criminalidade ao invés de combatê-la.
Críticas ao governador Cláudio Castro
A Comissão Arns também criticou duramente o governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), pela tentativa de transferir a responsabilidade para o governo federal. A entidade defende que União, estados e municípios trabalhem em conjunto para enfrentar a insegurança, mas ressalta a falta de “compostura e de seriedade” do governador.
A nota finaliza com um apelo para que se contenha o que classifica como “displicente morbidez” e “descaso com a vida” por parte do governador, clamando por um fim à “desumanidade”, “crueldade” e “abuso de autoridade”.
Leia a nota pública da Comissão Arns na íntegra
Mais um Rio de sangue entre excessos e omissões governamentais
A Comissão Arns expressa sua consternação pelas mais de cem mortes, até agora conhecidas, que resultaram da chamada “megaoperação” policial nos Complexos do Alemão e da Penha, ontem, no Rio de Janeiro. Com pesar, estende sua solidariedade às famílias das vítimas, quatro das quais policiais em serviço. Lamentamos também pelas pessoas feridas e aterrorizadas, que sofreram traumas em função do despreparo das autoridades incumbidas de zelar pela segurança pública.
Esta nota vem manifestar também indignação e repúdio. A sucessão de chacinas promovidas por tropas armadas, nas regiões mais pobres da cidade do Rio de Janeiro, vem marcando recordes sequenciais no número de óbitos. O descontrole demonstra que o inaceitável se acomodou em padrão de conduta do Estado, a despeito do direito à vida da comunidade dos cidadãos fluminenses, especialmente dos mais frágeis.
Não é concebível, assim como não é suportável, que a metrópole convulsione em pânico, plenamente justificado, a cada vez que soldados marcham sobre as vielas para, supostamente, combater as milícias ou os traficantes. Como foi possível que a sociedade descambasse a tal ponto, em que a força bruta é o único critério, e um estado de exceção se erige em regra fatal?
O que se pode constatar de tudo isso, desgraçadamente, é que o Estado, além de não ser mais capaz de oferecer segurança pública, segundo as melhores técnicas de ação policial, vem se convertendo em promotor da insegurança, do desespero e do mais absoluto desconsolo.
Os excessos de ontem escancararam, mais uma vez, uma verdade dolorosa: alegando atuar para reprimir bandos de criminosos, as forças públicas, desprovidas de inteligência operacional orientada por senso ético, exacerbam a própria criminalidade.
As declarações constrangedoras do governador Claudio Castro tentando jogar a responsabilidade para o governo federal – logo desmentidas – só pioram o cenário. A União, os estados e os municípios precisam trabalhar em conjunto, ou a catástrofe da insegurança pública jamais poderá ser vencida. Para que isso se dê, no entanto, um mínimo de compostura e de seriedade se faz indispensável – e essa não tem sido a marca do governador fluminense.
Seu descaso com a vida chega a ser infamante, diante dos padecimentos de seus concidadãos. Essa displicente morbidez precisa ser contida imediatamente. Chega de desumanidade. Chega de crueldade. Chega de abuso de autoridade!

