sábado, 21/06/2025
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Uma queda de avião por mês: acidentes no trabalho matam em média 212 pessoas

A maior causa de afastamentos de trabalhadores no Brasil foi, nesse período de 2012 a 2022, por doenças Osteomuscular e Tecido Conjuntivo,

acidentes de trabalho

212 trabalhadores e trabalhadoras, em média, morrem por mês no Brasil em decorrência de acidentes de trabalho. É como se um avião de grande capacidade caísse todos os meses no País e todos os seus ocupantes morressem.

De acordo com dados do Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho, foram quase 7 milhões de notificações de acidentes de trabalho registradas no Brasil de 2012 a 2022. Desse total, 25.492 mil foram registros de morte do trabalhador ou trabalhadora. Uma média de 2.549 trabalhadores mortos por ano (212, em média, por mês).

Nesse período, os Transtornos Mentais e Comportamentais passaram a representar a terceira maior causa de afastamentos de trabalhadores no Brasil. De 2012 a 2022, foram registrados 2,3 milhões de afastamentos por esse motivo.

A Norma Regulamentadora n. 1 (NR-1), que define as regras de segurança e saúde no trabalho (SST), atualizada em 2024, incluiu a gestão de riscos psicossociais no ambiente de trabalho, como assédio moral e sexual, dentre aqueles que devem ser geridos pelas empresas.

No entanto, essa atualização, ao mesmo tempo que vem proporcionando o aumento do debate sobre a relevância do adoecimento mental dos trabalhadores, também apresenta um grave problema a ser equacionado. Nessa atualização, que entrará em vigor no dia 26 de maio deste ano, não foi estabelecido o que são riscos psicossociais. E nisso reside o problema. Como não há essa vinculação na Norma, fica a cargo da empresa definir (i) quais riscos serão inseridos nos seus Programas de Gerenciamento de Riscos; e (ii) fica a cargo da empresa a gestão do que ela considerar como riscos psicossociais. Não é por menos que tem surgido muitas empresas que estão oferecendo serviços por aplicativo para a gestão de riscos psicossociais no ambiente de trabalho.

A maior causa de afastamentos de trabalhadores no Brasil foi, nesse período de 2012 a 2022, por doenças Osteomuscular e Tecido Conjuntivo, com 4,8 milhões de registros. Em segundo lugar estão as Fraturas, com 4,5 milhões de registros de afastamentos.
Chama a atenção que, nesse período, a Administração Pública em Geral é o setor econômico que ocupa o terceiro lugar em número de notificações de acidentes de trabalho no Brasil. De 2012 a 2022 foram registrados pouco mais de 168 mil afastamentos de trabalhadores desse setor.

O setor econômico com o maior número de afastamentos é o de Atividades de Atendimento Hospitalar, com pouco mais de 603 mil, em que a ocupação de Técnico de Enfermagem representa pouco mais de 50% desse total.

O segundo em número de afastamentos é Comércio Varejista de Mercadorias em Geral (com predominância de produtos alimentícios – hipermercados e supermercados), com 216 mil registros nesse período.

No estado de São Paulo, foram 2,2 milhões de notificações de acidentes de trabalho registradas no período de 2012 a 2022, segundo dados do Observatório. O estado concentra, desse modo, 32,5% dos acidentes de trabalho registrados no Brasil.
No estado foram registrados 635 mil afastamentos de trabalhadores por acidentes de trabalho. O que representa uma média de 63,5 mil trabalhadores afastados por ano em decorrência de acidentes de trabalho.

No ano de 2022 foram registrados 204 mil acidentes e 592 óbitos de trabalhadores no estado de São Paulo, consideradas as ocorrências somente do mercado formal de trabalho. O setor econômico com mais notificações no estado foi o de Atividades de Atendimento Hospitalar, com 18,3 mil notificações, seguido do Comércio Varejista, com 6.141 registros, e o Transporte Rodoviário de Carga, com 4.829 registros.

Esses dados, por sim só, já são alarmantes e indicam uma inanição de setores públicos e privados em relação à saúde e segurança dos trabalhadores e trabalhadoras. Porém, as condições de trabalho no Brasil podem ser ainda mais precárias quando se constata que muitos acidentes não são comunicados aos órgãos oficiais. Dos 613 mil acidentes ocorridos em 2022 no Brasil, em 116 mil não houve emissão da CAT (Comunicação de Acidente de Trabalho). Ou seja, 19% dos acidentes de trabalho não são comunicados no Brasil. Além disso, 64% dos acidentes ocorridos no Brasil não foram cadastrados no Sinan (Sistema de Informação de Agravos de Notificação), sistema voltado à coleta, transmissão e disseminação de dados sobre vigilância epidemiológica das doenças e agravos de notificação compulsória.

Apesar da gravidade que esses números apresentam, como dito pela pesquisadora Maria Maeno, “os dramas das pessoas e famílias atingidas por acidentes do trabalho passam ao largo das manchetes de jornal, dos sítios eletrônicos e das preocupações da opinião pública ou do conteúdo das disciplinas dos currículos dos cursos dos diversos níveis da educação formal. As doenças ocupacionais suscitam interesse somente de segmentos específicos, como os sindicatos ou os próprios trabalhadores atingidos, que formam associações e movimentos em busca de visibilidade e justiça social”. Mas, apesar disso, como faz questão de enfatizar Maria Maeno, “é fundamental criar espaços de discussão e elaboração de políticas públicas sobre saúde e segurança dos trabalhadores. Esses espaços devem privilegiar a participação dos trabalhadores e trabalhadoras, para que possam, em articulação com Governo, Legisladores e outros seguimentos comprometidos com suas lutas, não somente serem ouvidos, mas, sobretudo, tenham suas demandas atendidas”.

Maria Maeno, médica do trabalho e pesquisadora da Fundacentro, é da comissão responsável pela organização da Conferência Livre Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora, etapa preparatória da 5ª Conferência Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora, que ocorre no dia 19 de março, das 8h30 às 18h, na Fundacentro.

A Conferência é um momento importante para se debater, propor e decidir sobre ações e políticas para fortalecer o acesso do trabalhador à saúde no Sistema Único de Saúde (SUS) e aos sistema de proteção social. Participem desse importante momento de construção de políticas voltadas à saúde do trabalhador e da trabalhadora.


* O Radar Democrático publica artigos de opinião de autores convidados para estimular o debate.

Rogério Bezerra
Rogério Bezerrahttps://gravatar.com/creatorloudly177c571905
Geógrafo, Mestre, Doutor e Pós-doutor em Política Científica e Tecnológica pela Unicamp. Foi Diretor de Pesquisa Aplicada da Fundacentro. Coordenador do Movimento Pela Ciência e Tecnologia Pública. Atua especialmente em temas relacionados à análise e avaliação de políticas públicas.

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